quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Curitiba por Rafael Greca - Entrevista concedida a Revista Voi, em 2005


Como foi a infância em Curitiba? 

Nasci em Curitiba, em março de 1956, na Maternidade de Nossa Senhora do Rosário, A rua onde Nasci levava o nome do meu Bisavô, Comendador José Ribeiro de Macedo, que foi um dos fundadores da Universidade Federal do Paraná. Ele apoiou Rocha Pombo na criação da primeira universidade do Brasil. Lidava com engenho de erva-mate. Mas também sou de uma família italiana, que é como o povo me Conhece, Rafael Greca. Descendo do meu avô, Greca, que foi um velho pedreiro calabrês que veio para Curitiba em 1877, na época da Construção da estrada de fero Curitiba-Paranaguá. Meu avô foi responsável pela introdução em Curitiba da pavimentação em paralelepípedo e pelas famosas calçadas de lousinhas em granito. Era coroinha nas missas das igrejas catedral, da ordem e do Rosário. Estudei na escolinha Tia Paula e no colégio Nossa Senhora Medianeira, dos padres jesuítas. Depois me formei em engenharia, economia e quase me formei também em jornalismo, mas desisti de ter tantos diplomas. 

Foi na escola que descobriu o dom da oratória? 

Fazia discurso desde pequeno, acho que desde os quatro anos. Ficava em um banquinho discursando em aniversários. Também ganhava as maratonas escolares de declamação de poesias, oratória e redação. 

Qual mais lhe marcou? 

Ganhei a maratona escolar da prefeitura no tempo do prefeito Ivo arzua, quando foi inaugurada a Praça 29 de Março. A praça foi inaugurada por mim e pelo Chico 

Buarque, que veio cantar “A banda”. Era o menino que escreveu a mensagem para o prefeito dos 300 anos de Curitiba, que depois viria a ser eu mesmo. Essa mensagem ficou em um cofre de concreto perto do painel do Poty, mas que não encontrei. Tenho a mensagem do arquivo da prefeitura. A carta tratava de diretrizes de urbanismo, de respeito ao povo, qualidade de vida. Mas achei que era um texto de um piá muito chato. Porque a minha famosa mensagem é muito séria, circunspeta. Acho que era muito mais velho quando era criança do que sou hoje. 

Como foi a passagem de engenharia e economia para a política? 

Fiz engenharia e economia e fui trabalhar no IPPUC (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba), onde aprendi o urbanismo, e ainda trabalhei na Fundação Cultural de Curitiba, na área de memória. Isso ainda era no tempo da ditadura. Quando veio a redemocratização do Brasil, me pediram para ser candidato a vereador. Assim entrei na política e estou até hoje. 

Como prefeito, foram feitas mais de seis mil obras, qual era o principal objetivo? 

Foram 6600 obras de orçamento superior a 300 mil reais. Com elas, ganhamos o prêmio mundial do Habitat, pela ONU (Organização das Nações Unidas), o Word Habitat Award. Pelo conjunto das ações de cidadania desenvolvidas em Curitiba: Faróis do saber, Ruas da Cidadania, Parques, Redes de serviços (transportes, saúde, creches, escolas). Isso impressionou muito a Housing and building Foundation (Fundação para Construção e Moradia) da ONU pelo fato de Curitiba oferecer todos os tipos de serviços em rede. 

As Ruas da Cidadania também foram implantadas em outras cidades? 

Em Campinas, as Ruas da Cidadania chamam-se Poupa Tempo. Salvador tem o serviço em uma espécie de galerias. Parece que a ONU também pegou o projeto para utilizar em Cabul, a capital do Afeganistão, no núcleo de reconstrução da cidade. Sei apenas que o projeto foi levado e não sei se chegaram a terminar. 

Após quase 10 anos do fim do seu mandato como prefeito, como está a cidade e quais suas marcas? 


Curitiba é uma grande cidade e vai ser por muito tempo. Ela enfrentou os problemas com antecedência. O último prefeito, Cássio Taniguchi, apesar de não ter acrescentado muito à minha obra, conservou aquilo que deixei. Sobre minhas marcas, tenho muito orgulho de ter feito o desfavelamento de Curitiba e evitado as invasões de terra com a criação do bairro Novo e das moradias Santa Rita, fazendo casas e dando oportunidade de moradia para perto de 32 mil famílias. Depois que saí, a COHAB (Companhia de Habitação) ficou bem mais lenta. Tenho orgulho de ter feito em Curitiba um conjunto de oito parques turísticos admiráveis, que são: Bosque do Papa, Bosque Alemão, Parque Tingui com o Memorial Ucraniano, Parque Tanguá, Bosque Italiano em Santa Felicidade, Bosque de Portugal, memorial Árabe e a Fonte de Jerusalém, com os anjos simbolizando as três religiões monoteístas em frente ao Jardim Los Angeles. Tenho orgulho de ter restaurado a Catedral, a Universidade Federal do Paraná e a Sociedade Garibaldi. Além de ter trabalhado para consolidar o pólo de informática na Cidade Industrial e de ter sido o sujeito que mais bibliotecas fez no Brasil. Fiz mais de 50 bibliotecas com os faróis do Saber, que são as bibliotecas de Bairro, com cerca de oito mil livros cada uma e computadores ligados à internet. 

Como foi o ministro do Esporte e turismo, Rafael Greca? 

No Governo Federal não fui muito feliz politicamente porque quis enfrentar os bingos. Somente no Paraná é que os bingos estão proibidos. Queria impor um sistema de controle baseado na cobrança de impostos e na avaliação por softwere blindado de quanto eles arrecadavam em cada jogo e recolher isso na caixa Econômica Federal. Naturalmente, fizeram campanha contra porque não querem ser controlados. Depois descobri que quem me denunciava era ligado aos bicheiros do Rio de janeiro e à quadrilha do Waldomiro Diniz ligado ao ministro José Dirceu, que na época era soem deputado do PT (Partido dos Trabalhadores). Mas me orgulho de ter sido ministro por ter trazido para o Paraná o Prodetur do Sul. Antes só existia o Prodetur do Nordeste. Agora estão entrando para o Paraná 100 milhões de dólares para financiamento do turismo no Paraná. Há outro 100 milhões para Santa Catarina, outros 100 para o Rio Grande e 50 milhões para o Mato Grosso do Sul. A idéia do Prodetur do é estimular a vocação turística dos estados por meio de financiamentos. Ainda como ministro, fiz a restauração das cidades onde nasceu o país, Porto Seguro e Cabrália, e o Parque do Descobrimento do Brasil, na comemoração dos 500 anos. 

O que acha da criação do Instituto Curitiba Turismo? 

Todas as iniciativas a favor do turismo são bem-vindas porque o turismo é a invenção dos empregos. Estamos propondo ao prefeito Beto Richa, com vista aos eventos da ONU que vão acontecer em março do ano que vem, a edição de um guia turístico do Paraná em quatro línguas. Porque na minha visão, temos uma bela cidade, mas ainda não há folhetos e livros que falem da cidade como ela merece. 

Quais principais projetos da atual gestão como deputado? 

Estou com 57 projetos de lei. Um já aprovado é o projeto que dispensa as empresas do pagamento da reserva de energia.Trabalho também em um programa paranaense de biodiesel doce, combustível de bagaço e palha de cana-de-açúcar. O Beto Richa prometeu baixar a passagem de ônibus e tirou só dez centavos. Se os ônibus utilizassem esse biodiesel daria para baixar até 50 centavos, senão um real. Além de ser um combustível ecologicamente correto. Também estou criando um projeto de Casa de Maria, que são pousadas para mulheres vítimas de violência nas principais cidades do Paraná. 

Como é a relação com o governador Roberto Requião? 

Muito boa hoje. Nossos adversários dizem que ele me xingava. E ele me xingou muito mesmo. Uma vez fui ao senado e ele disse que eu era da máfia italiana ligada aos bingos. Depois ele teve a grandeza de pedir desculpas. Agora, quem tem que explicar porque me xingava na época e agora não me xinga mais é ele. Vejo nosso governador como um sujeito muito honesto, interessado em fazer o bem, em buscar soluções mais simples para o interesse público. Ele controla tudo, até os detalhes. Às vezes ele quer entender de tudo. Isso mostra um sujeito muito preocupado em fazer direito o ofício de governar. Também me divirto no convívio intelectual com o Requião. É muito saboroso. Porque nós sabemos usar as armas da ironia. 

O que o turista não pode perder em Curitiba? 

A Linha Turismo. Se ele entrar no ônibus na porta da catedral, poderá ver os parques de Curitiba em um único passeio. Também não deve perder o Memorial da Cidade, com a síntese da história pintada nas paredes por Sérgio Ferro e com o Rio de Pinhões, importante também é percorrer os bosques típicos das imigrações para entender a alma da cidade. O museu Oscar Niemeyer é um local incrível e com programação artística de ótima qualidade. Acho que é imperdível o passeio de trem para Paranaguá. E uma esticada até Foz do Iguaçu para ver o lugar mais bonito do Brasil. 

Quais lugares recomenda para boa gastronomia? 

A cidade tem pontos secretos, por exemplo, a churrascaria Ervin, na Mateus Leme, com a maionese mais honesta do mundo. As empadinhas da massa podre do Caruso. As deliciosas tortas da padaria América, na rua Trajano reis, com a Carlos Cavalcanti, feitas em um forno crupi importado da Alemanha. È importante ir a Santa Felicidade. A comida italiana servida lá não existe mais na Itália e foi trazida pelos imigrantes na época. E olhe que dica de gordo é muito boa (risos)! 

Como curtir o frio de Curitiba? 


O frio de Curitiba é bom curtir junto ao forno de pizza da Baviera, uma das mais antigas da cidade. Ele pode e deve ser curtido de manhã bem cedo, nos parques. Porque ali se tem a sensação antiga da geada, isso para quem não tem reumatismo (risos). O frio também é muito bonito em qualquer um dos pinheirais nos arredores da cidade. Sobre tudo quando se tem um fogão de lenha para sobre a chapa assar pinhões, ou tomar a sopa de pinhão que é uma das delícias curitibanas. Certa vez, levei ao restaurante do Hotel Pestana pinhões recém caídos da chácara. Daí, o chef me fez um risoto de bacalhau com pinhão. O chef Alexandre Vicki estudou em Belmonte, onde nasceu Pedro Álvares Cabral. Ele é um menino curitibano que foi estudar na Europa. 

O melhor da arte? 

Sem dúvida o pintor da alma Curitiba foi o Poty, que desenhou como ninguém o nosso jeito de ser e procurou mostrar isso nos grandes painéis de azulejo que estão espalhados pela cidade. Existem também artistas muito bons como Lange de Morretes, De Bona, Andersen, Zaco Paraná, João turin. Além de artistas comtenporâneos como o Rogério Dias, Francisco Faria, Sérgio Ferro, Cláudio Cambe, Rubem Esmanhoto, Zimmermann. Curitiba é uma cidade rica culturalmente. Amúsica vai da “Sintonia Sertaneja”, de Brasílio Itiberê da Cunha, que foi composta na fundação da música nativista brasileira, no tempo do Chopin, no século XIX. Até a música sertaneja “As Mocinhas da Cidade”, da dupla caipira Belarmino e Gabriela, que imortalizei na fonte existente na rua Cruz Machado. Além das modernas músicas de rock, como “Lá Vai o Trem”, do Grupo Blindagem, que é uma deliciosa canção curitibana. Para descobrir gente nova, estamos até fazendo um festival de bandas, na TV Educativa, que vai até dezembro. Já temos 179 inscritos. Na literatura não como esquecer o vampiro de Curitiba, Dalton Trevisan. Além dos poetas, Helena Kolody, Carmen Carneiro, Tássio da Silveira, Miguel Sanchez Neto e o nosso Paulo Leminski. Nas artes cênicas já tivemos o Cleon Jacques. Temos expressões nacionais, como Maria Fernanda Cândido, Ary Fontoura, Paulo Goulart e Nicete Bruno, Cláudio Corrêa e Castro, Guta Estresser e Guilherme Weber. Aliás, a Guta Estresser e o Guilherme Weber fizeram estágio nas produções teatrais da época em que fui prefeito. Uma com a Fernanda Montenegro, na peça Dias felizes, de Beckett, e o Guilherme Weber, na produção da tragédia de Shakespare, Rei Lear, que mandei encenar com Paulo Autran e atores locais. Tenho muito Orgulho em ter ajudado a carreira deles.

Nenhum comentário: